Perdoar ou se estranhar?

Quando o Evangelho conta a história do Rei que acertava as contas com seus empregados, a pergunta de fundo é: “Quantas vezes devo perdoar?” Relata o texto que um empregado que devia uma fortuna e não tinha como pagar foi condenado, mas prostrou-se aos pés do patrão e implorou por misericórdia. Teve uma oportunidade mas, saindo dali, cobrou dos seus devedores, agindo de maneira muito dura e violenta. Ao saber dessas atitudes o patrão mandou chamá-lo e o puniu por não ter agido conforme a graça que recebeu. Parece bastante simples: basta repetir com os outros aquilo que nos ensinaram! No entanto, não é tão simples assim.

Não nos constituímos enquanto sujeitos sem a relação com os outros. É o outro que nos define, nos enxerga, nos reconhece, nos respeita, nos valoriza, nos ensina e nos ama. Também é o outro que nos julga, condena, pune, nos leva ao fundo da mais constrangedora humilhação. A relação fundamental para nossa estruturação enquanto pessoas é estabelecida com o outro, e dela decorre as relações que construímos com os outros/outros. E essa última é mais importante que a primeira, pois ela é que nos revela.

Ao aprender na relação inicial o quão valioso é para nossa vida o primeiro contato com o respeito e o amor recebido, naquela oportunidade que nos é dada quando erramos, não há intrinsecamente uma definição fechada do sistema que nos levará a agir de igual maneira com os outros. A construção simbólica na condição humana é definidora da autorização ou desautorização daquilo que é possível ou não, daquilo que é valioso ou não, daquilo que é aprendido ou não. Isso é muito humano: mesmo sendo amados em casa, muitas vezes não sabemos amar em outras relações. Daí a necessidade de encontra-se nas relações não partindo de um EU IDEALIZADO PELOS OUTROS e sim da capacidade de ME ENCONTRAR IDEALIZADO EM MIM.

Quantas vezes perdoar? Tantas quanto você for capaz de se encontrar consigo mesmo, sem julgamentos prévios, sem modelos imaginários, sem frustrações com idealizações nos outros. Seremos capazes de perdoar inúmeras vezes quando nossa primeira capacidade de perdão for resultado que uma jornada inicial de auto encontro e auto perdão. Caso contrário, seremos estranhos a nós mesmos.

           Pe. Evandro Bastos – Pároco da Paróquia Santa Luzia (Sete Lagoas) 

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